O procurador-geral do Ministério Público da Paraíba, Francisco Seráphico, informou que vai investigar sob a ótica criminal áudios divulgados nesta sexta-feira (8) contendo uma suposta negociação de licitação para a Secretaria de Saúde da Paraíba. Os áudios foram divulgados pelo Paraíba Rádio Blog. Clique e ouça.
“Os fatos serão analisados dentro da investigação da Operação Calvário, para se aferir a pertinência ou não com o seu objeto”, afirmou o procurador.
Em um dos áudios, seria possível ouvir o ex-secretário de Saúde, Waldson Souza, o procurador-geral do Estado, Gilberto Carneiro, e um empresário não identificado. Eles estariam combinando como seria o procedimento para que a empresa em questão seja a ganhadora de uma licitação na área de saúde.
- Empresário – E aí… caso houver a licitação, assim, que vai haver, né!
- Waldson – Vai haver…
- Empresário – E aí, como seriam as formas?
- Waldson – Não, aí você tem que tá com tudo, certidão negativa.
- Empresário – Não isso aí não, isso eu tô tranquilo. Mas se aparecer mais gente, tal.
- Waldson – Vai aparecer…
- Empresário – Vai!
- Waldson – Pra enterrar, inclusive, entendeu?
- Empresário – Entendi.
- Waldson – Aí nós temos que ter… É isso que eu vou verificar, nós temos que ter coisas nesse projeto básico que não permitam, entendeu, muita flexibilidade.
- Empresário – É… nós temos essa parte de, do sistema que vai ser instalado, pro controle disso tudo. Esse teu inclusive é um pessoal já daqui que conhece bem e ele é que desqualifica quando não tá…
- Waldson – Essa é uma exceção que vai chamar muita atenção, viu Gilberto.
- Gilberto – Vai…
- Waldson – Vai! Porque as empresas vão brigar muito. Primeiro vão ficar puto porque vão perder o mercado, depois vão começar a questionar como é que vai ter um, vai ter que questionar a patente das marcas, vão colocar as exclusividades de recurso… Pode ter certeza.
Em outro trecho dos áudios, o secretário Waldson Souza supostamente afirma que o contrato será superfaturado. Eles também combinam como o esquema deve fluir para não vazar e falam em evitar o uso de emails.
- Waldson – Agora, Gilberto, isso aqui é o seguinte: eu vou apresentar esse projeto básico… Esse projeto vai depender de você digitar também.
- Empresário – Tá.
- Gilberto – Hum…
- Waldson – Porque eu vou botar ele no padrão da secretaria…
- Empresário – Vou passar tudo pra você digitar…
- Waldson – Porque isso aqui é meu, certo, é o termo de referência.
- Gilberto – Cuidado com essa história de email. Talvez seja melhor entregar num pendrive.
- Empresário – Certo…
- Gilberto – Esse negócio de circular no email, não é bom não!
- Empresário – É… é verdade!
- Waldson – E isso aqui é uma planilha nossa que eu vou… papel timbrado, tal, e adequá-la pra a nossa realidade com um valor maior, certo, porque isso aqui é minha estimativa de custo pra o projeto desse porte.
O procurador-geral do Estado, Gilberto Carneiro informou que está tranquilo, mas que só vai se pronunciar sobre os áudios posteriormente. O secretário de Planejamento Waldson Souza não atendeu às ligações e não respondeu às mensagens da reportagem.
O governador João Azevêdo afirmou que não tomou conhecimento dos áudios. “Eu acho que é preciso se ter muita cautela quando se faz julgamento e pré-julgamento”, disse.
Operação Calvário 2
A Operação Calvário 2 foi deflagrada no dia 1º de fevereiro para cumprir mandados de prisão e de busca e apreensão na Paraíba e no Rio de Janeiro. A operação investiga uma organização criminosa responsável por desvios de recursos públicos, corrupção, peculato e lavagem dinheiro por meio de contratos firmados por Organizações Sociais com unidades de saúde da Paraíba.
Na ocasião, foi cumprido um mandado de prisão contra Leandro Nunes Azevedo, que era assessor da Secretaria de Administração e foi exonerado recentemente, além do empresário Daniel Gomes da Silva – suspeito de chefiar a organização criminosa – e Michelle Louzada Cardoso. Também foram cumpridos mandados de busca e apreensão contra Waldson Souza (atual secretário de Planejamento e ex-secretário de Saúde), Livânia Farias (secretária de Administração) e Analuisa de Assis Ramalho Araújo (empresária ligada ao ramo alimentício).
De acordo com as investigações, no dia 8 de agosto de 2018, Leandro Nunes recebeu uma caixa de vinho com dinheiro em um hotel na orla do Rio de Janeiro. O momento foi gravado pelas câmeras de segurança e está na denúncia do Ministério Público. A caixa foi entregue por Michele Louzzada Cardoso, que atuava juntamente com Daniel Gomes, líder da organização criminosa, conforme o Ministério Público. Desde 2016 até agora, o grupo teria desviado R$ 15 milhões pelo país.
A investigação do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) sobre o desvio de dinheiro público da saúde por organizações sociais levanta a suspeita de que o dinheiro entregue a Leandro Nunes era para a campanha eleitoral de 2018. O grupo atuava através de duas organizações sociais: a filial gaúcha da Cruz Vermelha e Instituto de Psicologia Clínica, Educacional e Profissional do Rio de Janeiro, o IPCEP.
Nos últimos oito anos, a Cruz Vermelha e o IPCEP receberam dos cofres públicos pouco mais de R$ 1,7 bilhão em todo o país. A Cruz Vermelha é responsável pelo Hospital de Trauma da capital desde 2011, e recebeu até setembro de 2018 mais de R$ 930 milhões.
O IPCEP administra o Hospital Geral de Mamanguape e, de julho de 2014 até setembro de 2018, recebeu do estado mais de R$ 110 milhões.
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